"A Cidade [da dor, do amor, da amizade] do Sol"
Como costumo
dizer, ‘o que a gente leva dessa vida é o que a gente come e o que a gente vive’.
E dessa vivência, as artes e a cultura fazem parte desse prazer diário e sagaz.
E quem conhece, sabe, acrescentando essas felicidades à minha vida.
Sendo assim, em um aniversário desses,
recebi como presente de uma pessoa muito especial o livro O Caçador de Pipas (2003), o primeiro romance do escritor afegão-americano Khaled Hosseini. Tendo
como enredo o processo de transformação de um Afeganistão monarquista para um
regime talibã implantado, trazendo medo, horror e sofrimento a todos os
moradores, mas sendo aliviado pela lealdade e conflitos de uma grande amizade entre
dois meninos, que superou as diferenças emocionais, sociais, políticas e religiosas
dessa sociedade conturbada. Um livro inspirador e digno de ser visto sobre um
novo olhar, uma nova perspectiva, como quando foi adaptado para o cinema, em
2007, sob a direção de Marc Foster.
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"A Cidade do Sol" (Foto: Acervo Pessoal) |
Narra a história de Mariam e Laila.
Mulheres muito diferentes que se encontram em meio ao caos da intolerância, das
tradições distorcidas, da guerra contra tudo o que genuinamente somos. São protagonistas
unidas para sempre pelo desejo de superar o sofrimento e o medo, vencer a
opressão e encontrar a felicidade. Um desejo sem cor, sexo, raça ou credo.
Mariam tem 33 anos e viveu metade de sua vida num casebre isolado,
distraindo-se com as flores, os mosquitos e as pedras de um riacho. A amizade,
o companheirismo, o respeito e as preces ao seu Deus, ensinadas pelo mulá
Faizullah. Quando ela tinha 15 anos, sua mãe morreu e Jalil, o homem que
deveria ser seu pai, a deu em casamento a Rashid, um sapateiro de 45 anos, que
já havia sido casado e pai de um filho. Na grande cidade, Mariam cumprirá seu
destino de mulher: servir ao marido e dar-lhe muitos filhos. Mas, as pessoas
não controlam seus destinos.
Laila tem 14 anos. É filha de um
professor modernista que sempre lhe disse: “Você pode ser tudo o que quiser,
Laila!”. Ao longo da narrativa, sua mãe preocupa-se com os filhos que partiram
para lutar contra os soviéticos, e esquece que a menina precisa tanto de sua atenção
como os rapazes de suas preces. Laila vai à escola todos os dias, é inteligente,
sonha com países distantes, tem duas companheiras inseparáveis – Giti e Hasina -,
e seu amigo, Tariq. Sempre soube que a vida era muito maior do que casar e ter
filhos. Mas as pessoas não controlam seus destinos.
Hosseini conseguiu transcender em
meio a uma guerra, uma luta pessoal, intransferível, implacável. O futuro, o
destino, os sonhos. Uma estória emocionante, conflituosa, do encontro dessas
duas mulheres em meio aos desencontros de uma vida que não deixou margens para
escolhas, tentativas de mudança ou luta. Mas, quando o destino não ajuda, nós
ajudamos a ele acontecer, não é verdade?!
O encontro do Oriente com o
Ocidente, o encontro de almas, de sonhos frustrados, de dor, sofrimento, amor e
ódio fez renascer a esperança de uma luta por dias melhores. Uma amizade alicerçada
na empatia, na vida que a vida poderia ter as dados, trouxe para Mariam e Laila
um novo recomeço. Um, um pouco mais triste e incapaz de fazer um novo destino,
mas suficientemente importante para fazer o bem, algo admirável a alguém que
ainda tinha muita coisa pra viver. Para outra, o recomeço, a luta por aquilo
que seu pai sempre soube que seria capaz de viver e transformar-se um dia.
O amor, em suas diversas formas, transcende
a lógica e a incoerência. A mãe de vida, de dor, de alma. A mãe por escolha, a
mãe por necessidade. A mãe por falta de escolha, a mãe da mãe. A mãe que nunca
conseguiu ter, a mãe que sempre desejou ser. A mãe que a vida escolheu ser, a
mãe que o destino optou por viver para ser mãe.
Talvez uma visão dramática me faça
relatar como a vida pode ser simplesmente injusta com alguém ao longo de toda
uma vida, sem perspectiva de qualquer tipo de mudança, de transformação. Mas,
ao mesmo tempo, uma vida sem importância, sem amor dos que mais amou, trouxe um
suspiro de que o seu destino era apenas fazer os que passaram a amar, serem
felizes.
E os amados, que devido a uma
decisão tão dura, porém sensata, conseguiram simplesmente (e grandiosamente)
agradecer pelo presente de RECOMEÇAR. A gratidão é um dos sentimentos mais
nobres. E essa nobreza tem nome; Mariam.
“
[...] Mas é principalmente no coração de Laila que Mariam está presente; é ali
que ela brilha com toda a intensidade de mil sóis.”
Um pouco do autor
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Khaled Hosseini (Foto: Divulgação) |
Khaled Hosseini nasceu em Cabul -
Afeganistão, e se mudou para os Estados Unidos em 1980. Seu primeiro romance, O
Caçador de Pipas, foi um best-seller internacional, publicado em 40 países e 1º
lugar nas listas de mais vendidos. Em 2006, Hosseini foi nomeado embaixador
americano da UNHCR – Agência das Nações Unidas para Refugiados. Ele mora no
norte da Califórnia com a mulher e os dois filhos.
#Afinal, Cultura Viva Comunica!
Ótimas observações! A Cidade do Sol é realmente um livro encantador, apesar de triste e duro, assim como é a realidade dessas mulheres (as fictícias e as reais).
ResponderExcluirHallita, obrigada pela sugestão de leitura!
ExcluirFoi de uma grandiosidade imensurável.
É de extrema importância esse feedback e alimentação diária de coisas que nos fazem refletir, nos traz da ficção pra realidade e vice-versa.
Fico feliz que tenhas "curtido"!
Abraços,
Anne Fernandes